LULA ASSISTE UM NAMORO
Mercado flerta com agenda reformista de Bolsonaro
DANIELLE BRANT - DE SÃO PAULO - 12/11/2017 02h00
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Não é segredo para ninguém quem os economistas e os
analistas de instituições financeiras —o chamado "mercado"— preferem
ver na disputa presidencial do ano que vem: o ministro da Fazenda Henrique
Meirelles e os tucanos Geraldo Alckmin, governador de São Paulo, e João Doria,
prefeito da capital paulista. Mais recentemente, porém, um elemento estranho
foi anexado à lista: o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ).
O capitão da reserva passou a angariar apoio após
desbancar os preferidos do mercado nas pesquisas eleitorais e despontar como
rival do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno. O próprio
Bolsonaro se deu conta do trunfo.
Enquanto Lula seguiu pelo interior do Brasil numa
caravana sem paz ou amor pelas reformas, Bolsonaro chegou a se reunir com
investidores em Nova York, apoiado pelo banqueiro Gerald Brant, da firma de
investimentos Stonehaven.
O seu novo combo econômico fala de Estado mínimo,
eficiente e livre da corrupção; prega a redução do juro para 2%; e até aceita
privatizações —algo no mínimo esquisito para um nacionalista de carteirinha que
considera um perigo o avanço global chinês.
Em 1999, em entrevista ao apresentador Jô Soares,
bem ao seu estilo controverso, defendeu o fuzilamento do ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso por privatizar a Vale e a Telebrás. Agora, como pré-candidato
à Presidência em 2018, até aceita avaliar modelos alternativos de privatização
da Petrobras.
"Bolsonaro adotou uma atitude que precisa ser
olhada com cuidado, mas que segue numa toada mais construtiva: tem sido menos
polêmico", afirma Ignacio Crespo, economista da corretora Guide
Investimentos.
A guinada liberal foi recente. Em março deste ano,
em entrevista à Folha, disse ser "completamente contra" a reforma da
Previdência, por exemplo. "É um remendo de aço numa calça podre. Está
muito forte a proposta dele [do presidente Michel Temer]", afirmou. Em
outubro, o tom já era de cautela. "Dá para sair, devagar, dá."
ESTRAGO MENOR
Devagar, ele vai se tornando palatável. Em agosto,
a XP Investimentos, a maior corretora independente do país, fez uma pesquisa
com 168 investidores institucionais e 400 assessores traçando cenários em caso
de vitória dos presidenciais mais óbvios.
À época, a Bolsa brasileira estava na casa dos 65
mil pontos. Para 95% deles, a Bolsa ficaria abaixo de 60 mil pontos se Lula
vencesse as eleições. Sob Bolsonaro, esse cenário era visto por 78%. Para 31%,
uma vitória do petista levaria o dólar acima de R$ 4,10. No caso do deputado
federal, apenas 15% desenham esse cenário. Ou seja, entre Lula e Bolsonaro, o
segundo faria um estrago menor.
A própria equipe da XP estranhou o resultado.
"O Bolsonaro falava em estatizar companhias, agora diz que tem que
diminuir o tamanho do Estado. Ele gera imprevisibilidade", afirma Celson
Plácido, estrategista-chefe da XP Investimentos.
Quem tem estrada no mercado financeiro tece
explicações para o fenômeno. "Pela conversa com investidores, o Lula hoje
é um problema. Pode ser disruptivo. O Bolsonaro tenderia a causar um estresse
menor no mercado", avalia Raphael Figueredo, sócio-analista da empresa de
análise Eleven Financial.
Haveria também uma aversão ao PT. "Bolsonaro
se torna mais interessante porque não seria o PT no poder. Mesmo o Lula tendo
feito um primeiro governo favorável ao mercado, a percepção hoje é que ficaria
mais fácil com Bolsonaro montar um ministério com figuras alinhadas à atual
agenda", diz José Francisco de Lima, economista-chefe do banco Fator.
Para o cientista político Carlos Melo, professor do
Insper, o que está ocorrendo é "autoenganação" coletiva.
"A visão do Bolsonaro sobre economia é zero,
ele nunca teve preocupação com isso. Mas agora ele está fazendo um discurso
liberal para reduzir a resistência do establishment econômico contra ele. É uma
estratégia. O liberalismo econômico não está no DNA dele", afirma.
Na avaliação de Melo, os dois pré-candidatos até
teriam um ponto em comum que costuma desagradar muito o mercado financeiro:
"Tanto Lula quanto Bolsonaro são intervencionistas", diz ele.
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